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Artigos

  • Ministério e coalizão sem volta

    A oposição continua a atacar o governo pela demora da composição do Ministério e está a perder a leitura da proposta de Lula - e a sagacidade de suas entrelinhas. Vamos creditá-la à intuição do presidente, aberta à prática pura do que lhe cobra a direção do país. Despegou-se da marca partidária, ou de todos os pruridos de ortodoxia, no que é, hoje, a busca da mudança nacional.

  • Opinião: "DEMs": provectos e espertos

    Não se subestime o a que vem o PFL metamorfoseado em DEMs, ou seja, o partido dos democratas na denominação anti-rugas, para a mais venerável legenda do status quo brasileiro. Tem quase o nome de pílula rejuvenescedora neste período de maiorias maciças do governo, e de coalizões que não acabaram ainda de lançar a sua tarrafa. Nem se subestime, por outro lado, a sua força já nas próximas eleições municipais - já que a sigla está no poder nas duas megalópoles do país. Sobretudo, num Rio de Janeiro que irá às urnas sacramentado pelo sucesso do Pan, e a que, afinal, não faltou a Cesar Maia a decisiva cobertura federal.

  • Que diálogo das civilizações?

    Reúne-se em Aman a Academia da Latinidade, na sua XIV Conferência, para o avanço da possível entente ainda, no universo que já se rachava desde o choque da revolução de Khomeyni em 1978. Vinha ao chão o governo do Xá exatamente após as festas de restauração de Persépolis, em encontro do beautiful people de todo o mundo, nas galas do espetáculo meteórico. As pompas espoucavam às vésperas de toda a revulsão, em que o inconsciente social islâmico começava a perceber a expropriação da sua alma pelas perversas maravilhas do progressismo. O sucesso e champanhas da corte do Xá escondiam a violência da concentração da riqueza, o reino sem volta das corporações internacionais e a contrafação mimética de estilos de vida da sua elite de todos os modismos.

  • Socialismo milimétrico e esquerda à garra

    As perplexidades da eleição presidencial francesa mostram o desgaste histórico do que seja a esquerda, hoje, no mundo. Sobretudo de um Partido Socialista, para se tornar dono nominal desta opção política, como o maior denominador ainda desta tendência de voto. Não se trata de mostrar o fracionamento quase bacteriano das alas e contra-alas do velho radicalismo, no troca-troca das siglas comunistas mais e mais veneráveis na sua reivindicação fantasma. Nem também de atentar à bandeira à vista, como a da nova utopia, ou seja, a da pregação ambiental que troca os conflitos que sangram com a impaciência pelo degelo dos pólos.

  • Opinião: Um governo de maiorias desnecessárias

    Os dados estão aí, exuberantes, a mostrar a prosperidade do segundo governo Lula. Somam-se os números do aumento da renda per capita como da sua efetiva distribuição, de par com a queda das taxas de câmbio e de juros. Mais que acidente de trajetória, a chuva de dólares no país põe em causa a opção de crescimento ainda cravada na tônica exportadora da última vintena.

  • Um milagre, a vida anencéfala?

    Deveria ter sido apresentada ao Papa, frente ao milhão e meio de brasileiros no Campo de Marte, a menina Marcela, cega, surda e muda, anencefálica, e nascida pela fé inquebrantável de casal goiano. O que representa esse extremo da defesa da vida a que se vincula o anúncio maior do presente pontificado? Ou em que termos a confiança de um milagre, fervorosamente expressa pela família, levou-os ao parto de feto que, em horas da fecundação, atestava a absoluta inviabilidade de qualquer função cerebral, e a nascer a uma existência meramente vegetativa? A sobrevivência ao parto já se tornaria extraordinária. E é a essa, talvez, que se voltou o agradecimento do milagre, e a recompensa do sacrifício assumido pelos pais.

  • Opinião: Do cinismo ao exorcismo cívico

    Chegamos ao meio do ano com o avanço mais fundo - e talvez irrevogável - do que seja, à custa dos escândalos, o aprofundamento da nossa democracia. Viraram-se as páginas da contumácia com a corrupção, com direito ao cinismo cívico, que permite a exaustão das manchetes, que não se lêem, não se ouvem, tanto a falcatrua passe, do anedótico, a um novo grotesco. Não se repetiu ainda o flagrante dos dólares na cueca dos meliantes. O novo espanto é bom e vem de outro lado, com a polícia a chegar aos gabinetes e à cornucópia das contas da cosanostra, e à família presidencial sem que, do Planalto, algum freio se levante. A reação presidencial à "falta de cabeça" de Vavá deu nova enxurrada de apoio a Lula na opinião pública, que sabe que agora não é só pobre que anda de camburão.

  • O obsoleto Brasil dos amigões

    O atabalhoado da crise nessas últimas semanas leva a novas conquistas democráticas. Ainda em susto, continuamos a acreditar que a melhoria de um sistema se faz sempre harmoniosamente, em progressão imperceptível. Ao contrário, é aos trancos e barrancos que se chega agora a um novo Brasil que aperfeiçoa as suas instituições. E o que mais reconforta é ver o quanto a sociedade civil se espanta jubilosamente com a novidade e a quer, para ficar.

  • Opinião: A violência em berço esplêndido

    No estupor brasileiro desses dias, no entra-e-sai do escândalo da hora, e da supressão instantânea da memória, passamos, numa demissão moral irreversível, da indignação ao cinismo. Não temos precedentes dessa cumulação de choques, onde à violência se soma a corrupção, e o adubo da impunidade cria este mal-estar conformado com o que não acontece no aparelho da Justiça. O bom da crise é que, agora, pela primeira vez na nossa história, a polícia investiga e vai a fundo, e desarma uma mecânica encardida de conivência com o sistema. Nunca foi tanta a corrupção, não. Nunca se soube tanto sobre a dita, por uma vez perturbada a temperatura ambiente da conivência com a cosanostra. São novos olhos de ver, os que permitiram o governo Lula, a cumulação, às catadupas, do que estão revelando os grampos da polícia do Dr. Lacerda.

  • Opinião: Da Igreja-espetáculo à Igreja-testemunho

    A sucessão de choques das últimas semanas acarretadas pelas manifestações de Bento XVI, retornado da peregrinação latino-americana, tornam inequívoco o padrão, já, do novo pontificado. Enfrenta a secularização pela força de um testemunho, que não se poupa em mostrar o perfil que quer para a Igreja. Impõe-se uma recuperação da mensagem, para pautar inclusive todo o novo teor profético que sinaliza o papa Ratzinger. E tal pode ir à própria guinada, frente ao pano de fundo do Vaticano II e à sua opção pela palavra no seio de nosso tempo.

  • Cansaram-se do estado de direito

    Em boa hora, de logo, a OAB do Rio de Janeiro, pela palavra candente do presidente Wadih Damous, impediu que se generalizasse a visão de uma advocacia ligada à ideologia clássica do moralismo udenóide brasileiro. Compreende-se a entrada em cena, pelo Cansei dos ricos super-ricos, confundindo a ordem pública com as benesses do status quo, que os favorece ainda mais. Mas a OAB de São Paulo não pode se atribuir o exercício privativo da cidadania, como se, naturalmente, o Brasil, visto dos seus luxuosos escritórios, fosse a paisagem da nação que acorda. De imediato, a reação dos sindicatos e dos movimentos sociais - passando ao "cansamos" - isolou de logo o mote de Paulo Zutollo, da sua Phillips, das suas verbas publicitárias, convocatórias eletrônicas, e consultorias milionárias para a movimentação da campanha.

  • A paradoxal popularidade de Lula

    O mal-estar cívico e o perdurar da popularidade de Lula trazem ao atual panorama da democracia e da sua consolidação toda uma nova problemática. Ou seja; a de se saber até onde o que está em causa é ' um novo pacto social empírico, vinculado à solidez de uma consciência política, independente das condições clássicas de legitimação e das instituições democráticas definidas a partir da modernidade. Colher-se-ia talvez, no quadro do Brasil de hoje, ,o resultado a longo prazo do voto obrigat6rio, letra¬,do ou analfabeto, à margem dos pressupostos do elitismo, tradicionalmente definido como pressu¬posto do exercício desta mesma cidadania.

  • Eleições livres e democracia profunda

    Vem a furo esta semana o segredo de Polichinelo, de que Chávez muda a Constituição para reeleger-se permanentemente à Presidência da República. No quadro internacional de hoje os países resistentes à hegemonia americana ganharam a legitimidade inicial das eleições livres. Mas, à sua consolidação por uma democracia profunda, preferiram um retomo à condição plebiscitária de mobilização popular no confronto ao Salão Oval.

  • O pertinaz Brasil de Renan Calheiros

    Duvida-se hoje, mais que há um mês, que Renan Calheiros será cassado. Todos os sintomas estão aí na frenagem do processo, empurrado à boa e tépida desmemória nacional. A polícia pede mais tempo, os dossiês não se concluem, as denúncias entram em delta amazônico, confiando no estuário final da confusão. Na crônica da corrupção esperada e consentida da vida política brasileira, o senador Calheiros inova, na determinação absoluta do pagar para ver e confiar na realpolitik do sistema por sobre a moção do aparelho de justiça e seu possível desfecho. Entre opositores e clãs do status quo uma convicção crescente se impõe, de que a crise perdeu todo o impacto, para ser administrada pelas comportas do "tudo bem" e, afinal, do "deixa disso".