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Revista Brasileira nº.122 (2025. 184 pp.)

Essa publicação faz parte da coleção Revista Brasileira

Editorial

Rosiska Darcy de Oliveira

Ocupante da Cadeira 10 na Academia Brasileira de Letras.

Já houve um tempo de luzes, tempos modernos, pós-modernos, hipermodernos. Já houve tempos de trevas. Eram assim chamados porque quem os vivia assim os sentia. Hoje um tempo sem nome deixa ao relento quem tenta reconhecer nele um traço dominante que permita amadurecer uma definição.

Um tempo que desafia interpretações e que, em ritmo de transformação fulminante, apaga os traços do que foi vivido, paralisa o pensamento e introduz nos espíritos um sentimento ora de perplexidade, ora de  impotência, tantas vezes de medo. Uma gigantesca esfinge imaterial nos provoca com voz metálica: decifra-me ou te devoro.

Uma “sociedade da solidão”, epidêmica, que não poupa as crianças e cria entre as pessoas uma “intimidade artificial”. O que foi considerado alarmismo está sendo substituído pela evidência de que “há algo de  podre no reino da internet“, diz Ronaldo Lemos. Para Hermano Vianna, um “tempo destrambelhado” em que, se há método na loucura, “a essência do método é ser louco, produzindo mais loucura”. “O que havia de podre no reino da Dinamarca vazou, via icebergs derretidos na Groenlândia querida por Trump e viralizou em catástrofes políticas embaralhando as ordens das coisas”. “Tempos bicudos”, finaliza Roberto Waack,
“em que a angústia derivada da quantidade e da qualidade de informações a que estamos expostos é a principal característica.”

A esfinge continua lá, decifrá-la quem há de? Estamos condenados a conviver com ela, apostando na arte e na cultura para livrar-nos de todo mal. Nossos recursos de resistência à barbárie.

Foi o que fez a rebelde Nise da Silveira que, confrontada ao mistério da doença mental, substituiu o eletrochoque pelo pincel, deixou livre a expressão dos “inumeráveis estados do ser” como recurso terapêutico e maneira de viver. O olhar de Mário Pedrosa, íntimo da alma dos artistas, viu nessas expressões turbulentas do inconsciente os traços da arte. Arte bruta.

Subitamente, Cacá Diegues, nosso imortal amigo, deixa órfão o cinema brasileiro. Luto e vazio. Mas Walter Salles, Fernandinha e Fernanda, assumem o bastão. Vai fazendo seu caminho além-fronteiras, a arte brasileira, com a excelência já bem conhecida e bem-amada entre nós. “Felicidade em momento Fernandas”, diz Ignácio de Loyola Brandão, saindo do cinema, emocionado e orgulhoso.

Especial destaque neste número o Retrato de Rachel de Queiroz, a senhora de Não me deixes. Sua vida, ficção e poesia.

Os livros, onipresentes na Revista Brasileira, constroem um vitral da nossa literatura, cada um colocando aqui sua peça luminosa em que falam de história, filosofia, ficção, jornalismo e dramaturgia. E de amor, outro mistério insondável na existência humana. A literatura, em sua gama infinita de máscaras, fala sempre de si mesma. Escrever é uma busca de sentido.

Livros é o que a Academia Brasileira de Letras, portas abertas, oferece como consolo às tragédias como a do Rio Grande do Sul. Livros são parte da reconstrução quando a destruição se instala, seja porque a chuva cai, assassina, seja porque o fogo da intolerância os condena à morte.

A esfinge, ela continuará aí, por um tempo sem nome, até que entre os que escrevemos, pensamos, criamos toda e qualquer forma de arte, todos juntos, uma geração talvez, alguém lhe dê um nome que decifre esses dias vividos na estranheza e na aflição.

Ficha da Obra

Ano: 
2025
Páginas: 
184
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