Nestes tempos de Trump, uma pulga nos surge atrás da orelha e pergunta: "E se os EUA que sempre admiramos, de Frank Sinatra, Scott Fitzgerald e Marilyn Monroe, só tiverem existido em nossa fantasia? E se nem tudo tiver sido ‘Fly Me to the Moon’, ‘O Grande Gatsby’ e ‘O Pecado Mora ao Lado’?". É uma pulga mal-informada, porque qualquer estudo elementar da história nos ensina que, quando se trata dos EUA, muito do que de fato importa nunca chega ao nosso conhecimento ou só chega quando não faz mais diferença. Eu, por exemplo, secular fã de Alfred Hitchcock e me julgando uma autoridade no mestre, só há pouco soube de uma história que o envolveu e, não por ele, deveria envergonhar toda uma nação.
Em 1945, terminada a Segunda Guerra e abertos os campos de extermínio, Hitch foi convidado por um produtor inglês a supervisionar um documentário sobre as atrocidades cometidas pelos nazistas, a partir de material filmado pelos soldados americanos, ingleses e soviéticos. Aceitou e, já em Londres, passaram-lhe meia hora de filme já montado. O que ele viu obrigou-o a ir para o hotel e ficar de cama por uma semana.
As cenas, então ainda inéditas, mostravam corpos nus e esqueléticos de prisioneiros às pilhas ou sendo desenterrados de covas que eles próprios tinham sido obrigados a cavar e onde foram atirados vivos; quilos de obturações a ouro e cabelo que lhes foram arrancados; e milhares de pijamas listrados de que não precisavam mais e que seriam destinados a novos prisioneiros.
Quando se recuperou, Hitchcock foi orientar os editores do documentário. Recomendou-lhes privilegiar as tomadas longas e à média distância, para não deixar dúvida sobre sua autenticidade, e evitar muitos cortes, para que não fossem acusados de manipulação. O filme foi montado e a narração em off, escrita.
Mas, então, os EUA se deram conta de que a Alemanha reconstruída seria uma aliada fundamental em sua nova luta contra a URSS. Não ficaria bem ofendê-la com essas imagens desagradáveis. O filme foi arquivado.