Cruzaram ao mesmo tempo na década de 1980, em breve lapso, um estudo conduzido pela comissão Brundtland e a publicação do título "A Insustentável Leveza do Ser", de Milan Kundera, sob o impacto das crises que se avizinhavam no final do século.
Parece que ninguém ouviu ou nada viu dos alertas, pois o batidão capitalista nem piscou o farol. A crise do petróleo e a depressão econômica serviram para fortalecer a manobra de Margaret Thatcher e retocar o retrato de Ronald Reagan.
Mas tem muita gente achando que o liberalismo veio para reciclar o sistema capitalista global, lançando uma ponte entre os abismos da erosão das democracias e avançando o controle sobre as riquezas do mundo. Corporações globais assumindo o lugar de governos e nações, sem qualquer cerimônia, com as fronteiras entre economias regionais sendo diluídas para dar lugar à globalização das economias, criando um "efeito Covid" no sistema financeiro global.
O mundo corporativo cria seus próprios mitos e impõe sua doutrina às instituições globais, até mesmo ao sistema ONU, ao Banco Mundial e a iniciativas pelo clima, como os ODS (objetivos de desenvolvimento sustentável), por exemplo. Desse cosmos instituído pelo sistema capitalista global, emerge o mito da sustentabilidade —e, como o poder dos mitos, também opera de modo inquestionável.
A COP30, que acontece daqui a um mês, passa a exigir do governo brasileiro um grande esforço de comunicação para debelar a desinformação que domina o tema, com a prevalência das críticas à falta de hotéis e ao custo da hospedagem para europeu em Belém.
Marina Silva recebeu a iniciativa Redes Cordiais na última quinta-feira (9), juntando os mais ativos criadores de conteúdo, influenciadores e cabeças de rede no esforço de comunicar o que já foi feito pelo Brasil para recepcionar a conferência, além de indicar o principal compromisso que a ministra do Meio Ambiente espera obter desse megaevento na amazônia: o anúncio do TFFF (Fundo Florestas Tropicais para Sempre), alçado a até cerca de R$ 1,3 trilhão.
Com a fuga dos países ricos e a saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris, o TFFF aparece como âncora daquela COP que teria a missão de também salvar a amazônia.
O modo inquestionável do mito corporativo lança puxadinhos em todas as direções, criando soluções temporárias para conflitos insolúveis, como a afirmação de que a reciclagem aplicada como ferramenta da sustentabilidade irá criar as "condições necessárias" para a solução dos mesmos insolúveis conflitos de ordem natural —e tome o neoliberalismo como religião global, acima das relações entre povos e nações, e o capital paira como entidade sobrenatural sobre nossas cabeças.
O deus mercado se organiza em religião e toda demanda pode ser decidida com taxação e bloqueio da movimentação financeira dos infiéis ou hereges. Quem ou o que estabelece prioridade global em relação às questões levantadas por Milan Kundera e o relatório Brundtland, na década de 1980, e segue determinado as regras do jogo de busca ao tesouro escondido no fundo do mar, da terra e do ar?