O senador Alessandro Vieira, do MDB, apresentou um projeto de lei para que o Código Penal seja alterado para garantir que as punições aplicadas em caso de crimes de golpe de Estado ou de abolição do Estado de Direito Democrático sejam proporcionais ao envolvimento de cada indivíduo. O tema é relevante porque o Supremo Tribunal Federal está condenando a 14 anos de prisão a cabeleireira Debora Rodrigues dos Santos, que pichou a estátua da Justiça em frente ao prédio do STF com a frase “perdeu Mané”, referindo-se a uma fala do ministro Luis Roberto Barroso para manifestantes numa rua de Nova York.
No caso específico da cabeleireira, não vale a desculpa dada por ela de que não sabia que a estátua de Alfredo Ceschiatti tinha valor artístico alto, pois além dele há sobretudo o valor simbólico que também tem que ser levado em conta. Se não se atentou para esses detalhes, não pode ser excluída por suposta ignorância. Algumas outras pessoas que participaram das manifestações de 8/1 de 2023 já foram condenadas a penas de até 17 anos.
Há aspectos técnicos dessa dosimetria que já foram destacados pelo próprio Barroso, que hoje presidente do STF, como o fato de os manifestantes estarem sendo acusados por dois crimes que são semelhantes: abolição do estado de Direito e Golpe de Estado. Cada um desses crimes têm pena de 4 anos e meio e 5 anos, respectivamente. Seria, na visão de Barroso e de muitos juristas, uma maneira de condenar a mesma pessoa pelo mesmo crime duas vezes. O projeto do senador prevê que, nesses casos, os dois crimes sejam considerados juntamente, com apenas uma pena.
Além de mais, os condenados estão todos sendo acusados de “associação criminosa armada”, quando não há indícios de que estivessem armados, muito menos a cabeleireira, que usou um batom para fazer a pichação. O projeto de lei do senador Alessandro Vieira estabelece que somente quem teve participação ativa e relevante, como financiadores ou lideres, será enquadrado com maior rigor penal. Os que agiram sob a influência da multidão em tumulto, e praticaram atos materiais, sem participação no planejamento ou financiamento do ato devem receber tratamento jurídico mais brando.
O senador diz que “as decisões tomadas pelo Supremo, lideradas pelo ministro Alexandre de Moraes, se afastam cada vez mais do ideal de Justiça. A Justiça de verdade, de lastro institucional, exige proporcionalidade/razoabilidade das penas, individualização das condutas e pleno direito de defesa”. Note-se que uma das bases da denúncia contra o ex-presidente Bolsonaro e seus principais assessores, cívicos e militares, é a de que eles tramaram para criar um clima em Brasília que proporcionasse ambiente de revolta que seria o gatilho para a interferência das Forças Armadas, que resultaria em um golpe de Estado.
Portanto, há o entendimento, correto, de que a maioria das pessoas que participou daqueles atos de selvageria estava ali incentivada pelo momento, nada indicando que fossem partícipes de um movimento revolucionário. Os verdadeiros golpistas são aqueles que organizaram, planejaram e lideraram as manifestações , com o intuito de golpear as instituições. Não se fala aqui de impunidade, mas de punir com equilíbrio e sem espírito de vingança.
O corporativismo do Supremo Tribunal Federal neste processo não é bom sinal, embora todos estejamos chocados com a possibilidade de que alguns dos seus ministros tenham sido individualmente caçados e vigiados pelos golpistas, com ameaças até mesmo de morte. Mas são esses os que devem ser condenados às penas graves, não os inocentes úteis usados como massa de manobra. Se se condena uma cabeleireira a 14 anos, a quantos anos devem ao ser condenados Bolsonaro e sua turma?