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Para andar a reforma política

 

A reforma política entrou na pauta do Congresso Nacional na década de 80 do século passado e nela permanece até hoje. Duas questões envolvem esse tema. O primeiro é delimitar o que se entende por reforma política e quais as razões que nos levam a confundi-la com uma reforma eleitoral. O segundo é o que justifica uma reforma, seja política, seja eleitoral.


A última reforma eleitoral no país ocorreu na década de 1990 e abrangeu três mudanças: 1) uma nova lei de inelegibilidade (lei complementar nº 64, de 18/5/90); 2) uma nova lei dos partidos políticos (lei nº 9.096, de 19/9/ 95, alterada pela lei nº 9.259, de 9/1/ 96); 3) a denominada lei das eleições (lei nº 9.504 de 30/9/97).


Verifica-se que o âmbito das reformas eleitorais cinge-se a três aspectos do mesmo tempo: a) as eleições, b) os partidos políticos; c) as inelegibilidades. Esses três aspectos decorrem do nosso direito constitucional legislado. Por isso, as propostas de mudanças que a eles dizem respeito são, inquestionavelmente, consideradas reformas eleitorais.


Ao contrário das eleitorais, as reformas políticas incluem aspectos mais amplos que extrapolam o que se refere apenas aos sistemas eleitorais e aos sistemas partidários. Compreendem o sistema político, que inclui: a) as formas de Estado -unitário, federado ou misto; b) as formas de governo -presidencialista, parlamentarista ou misto; c) a esfera de competências dos integrantes do sistema político -União, Estados, Distrito Federal e municípios- e a esfera de atuação dos três Poderes.


Quando e por que a reforma dos sistemas se torna inevitável? A constatação empírica é que os sistemas tendem a ser reformados quando já não cumprem os fins para os quais foram instituídos. Em outras palavras, quando o desgaste por eles sofrido exige a mudança do paradigma em vigor.


Todo sistema é composto de elementos condicionantes e elementos condicionados, pois é esse requisito o que caracteriza todo o processo. Ao mudar um sistema, temos que definir previamente os elementos que o compõem. Só assim será possível buscar consenso quanto às alternativas viáveis. Em outras palavras, é mais importante a funcionalidade deles do que sua simples morfologia, já que todo sistema é integrado por vários elementos que conduzem a determinados fins.


Nos sistemas políticos democráticos, temos duas vigas fundamentais: os sistemas eleitorais e os sistemas partidários. E o que ocorre com os sistemas partidários são resultados provocados pelos sistemas eleitorais.


Os sistemas eleitorais admitem apenas três alternativas: 1) majoritários; 2) proporcionais; 3) mistos. Note-se, ainda, que, nas maiores democracias do mundo ocidental, 58% adotam eleições majoritárias (voto distrital), 21%, sistemas proporcionais, e 21%, sistemas mistos.


Os sistemas partidários, por sua vez, em relação à sua dimensão, admitem quatro e apenas quatro modalidades, em razão do sistema eleitoral em vigor: 1) de lista fechada; 2) de lista aberta; 3) de lista flexível; 4) de lista livre.


Tanto quanto sua dimensão, outro aspecto considerado em relação aos sistemas partidários é sua contenção ou proliferação. O recurso da contenção é a cláusula de barreira ou de desempenho, utilizada em 44 países democráticos.


Qualquer reforma eleitoral no Brasil só se materializará na medida em que o consenso for previamente acordado pelos partidos que constituem a maioria das duas Casas do Congresso, entre suas variáveis e suas respectivas modalidades.


Pretender misturar sistemas eleitorais, sistemas partidários e formas de contenção ou de proliferação partidária resultará sempre, como até agora, no impasse final que tem impedido qualquer mudança.


Da mesma forma, num país com as dimensões do Brasil, sua diversidade e seu pluralismo, não é possível misturar em "pacotes" medidas complementares dicotômicas, como se fosse possível conter em apenas duas alternativas modalidades divergentes.


Além de antidemocráticas, elas podem resultar em camisas de força. É o caso, por exemplo, de impor financiamento público ou financiamento privado para viabilizar as eleições no segundo maior eleitorado do mundo ocidental. A alternativa é que os partidos políticos possam, como nos Estados Unidos, escolher livremente o sistema que preferem: ou o público que exclui o privado, ou o privado que exclui o público.


Folha de S. Paulo, 21/4/2009