A maior parte dos diagnósticos sobre a indústria editorial em nosso país leva a uma só conclusão: a de que os preços dos livros são altos porque as tiragens são baixas. Em novembro de 1996, com o Plano Real consolidado, os suplementos literários dos principais jornais brasileiros comemoraram um fato alvissareiro para o nosso mercado editorial. Pesquisa da empresa britânica Euromonitor informava que o mercado brasileiro de livros já era o segundo das Américas, havendo ultrapassado o Canadá e só perdendo para os Estados Unidos. Os dados pareciam contestar os diagnósticos sobre o Brasil. Se éramos o segundo mercado de consumo nesta parte do mundo, caíam por terra as constatações de que as baixas tiragens e o baixo consumo justificavam o alto preço dos livros aqui editados.
Como tive a oportunidade de constatar, quando ministro da Educação, a sazonalidade dos resultados, porém, sempre refletiu a profunda dependência da indústria do livro do desempenho do referido ministério nas aquisições, por meio do Plano Nacional do Livro Didático — aliás, o maior programa governamental de distribuição gratuita de livros em todo o mundo. Os resultados de 1997, com a diminuição da produção, venda e consumo de novos títulos, não repetiram o sucesso do ano anterior. O faturamento da indústria editorial, que havia dobrado em 1990 e 1996, sofreu queda de 10% em 1997, ano que precedeu as sucessivas crises econômicas do México, da Rússia e da Coréia. Ao contrário dos efeitos devastadores na economia, o ano de 1998 revelou uma insólita recuperação do mercado de livros. A produção e a venda no consumo de obras didáticas aumentaram 3%; as obras gerais, 15%; os livros religiosos, 3%; os de natureza técnica, científica e profissional, 13%; e o programa do Ministério da Educação, com recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), cresceu 50%, passando de US$ 228 milhões para US$ 344 milhões.
O bom e surpreendente desempenho da indústria editorial em 1998 despertou o interesse de editoras estrangeiras que, no ano seguinte, passaram a investir no país com a compra de duas editoras, a Ática e a Scipione, que, juntas, detinham 35% do mercado brasileiro de publicações educativas. Mas os números continuaram contraditórios. O total de títulos produzidos caiu 3%, mas o número de exemplares vendidos subiu 17,8%, fazendo o faturamento aumentar 13%.
Números, cifras, valores e dados estatísticos sobre o modelo editorial e a indústria de livros no Brasil são o retrato fiel do velho refrão, segundo o qual os números “explicam, mas não justificam” os problemas que tão de perto afetam os lentos avanços da educação entre nós e as carências de nossa cultura. Em setembro de 2000, o caderno Idéias/Livros publicou a matéria “Raio X do mercado editorial”, na qual analisava o estudo “Cadeia de Comercialização de Livros”, realizado para o BNDES pelo economista William George Saad e o engenheiro Luiz Carlos Gimenez. No texto, o jornalista Rodrigo Alves comentava que “as distorções de um país que tem mais editoras do que livrarias provocam um gargalo que encarece e dificulta o acesso ao livro”. E, note-se, eles são valiosos instrumentos para ajudar a vencer as desigualdades que ainda permeiam a nação e a convertem na mais aguda e visível de todas as nossas questões coletivas.
Acredito não haver discrepâncias — ideológicas ou partidárias — quanto à relevância da questão social. Pode-se discordar nas formas para superá-la, mas ninguém ousaria negar ser esse o maior obstáculo à plenitude democrática a que todos aspiramos para nossa pátria. “As modas vão e vêm”, disse John Kenneth Galbraith, “mas os livros (sobretudo os grandes) ficam”. Enfim, “os livros” — observou com fina percepção Mário Quintana — “não mudam o mundo. Quem muda o mundo são as pessoas. Os livros só mudam as pessoas”.
Correio Braziliense (DF) 5/3/2007