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China, Índia e a globalização obsoleta

 

Este ano crítico de 2013 será marcado pelo epitáfio da Primavera Árabe, na desmoralização em que ora mergulha o Egito, com a prisão de Mohammed Mursi, contra todos os cânones mais elementares do Estado de Direito.

Desnecessário atentar-se ao colapso de qualquer progresso institucional na Líbia pós-Kadafi. E a Síria passou a ser um cenário devastado da nova guerra fria, num contraponto entre o Irã e o conluio ocidental das rebeldias no Oriente Médio.

É como se se removesse, de qualquer forma, todo esse protagonismo emergente na área, suscitado pelos primeiros conflitos tunisianos pela democracia.

Nesse contexto esvaziado, perguntar-se-ia pela dita nova globalização não hegemônica, na expectativa da tomada de cena pelos Brics. No seu centro, encontra-se a relação entre a China e a Índia e, de logo, a pergunta e o espanto: ambas controlam quase a metade da população mundial e continuam a se dar as costas?

Não se trata da mera demora na distribuição de possíveis e futuras áreas de influência. Mesmo porque ambas as nações-continente sempre se viram voltadas para a imensidade do seu interior, cujas culturas mal se abalam pelo progressismo ocidental ou pela modelagem contemporânea dos Estados-nação.

O peso nas suas próprias gravidades desvia o conflito das superpotências. Mas uma conferência de há poucos dias entre representantes de Estado de ambos os países mostra o quase vácuo da agenda China-Índia, numa quase demissão do que sejam esses papéis diante da nova globalização.

Esse quadro não admite vácuos nem sobretudo a tolerância com as velhas desestabilizações, suscetíveis de retomar o velho status quo das guerras frias, frente ao que seria o ganho histórico de nosso tempo, marcado pelo descarte da dominação ocidental.

Mas, ao mesmo tempo, a evitar esse enlace regressivo e fundamentalista do poder político com o religioso, tal como expresso pela Irmandade Muçulmana, no Egito. Ou uma prospectiva que começa a se delinear pela condenação do islã em Mianmar, em novo movimento de radicalismo budista, proscrevendo as minorias corâmicas no país.

Independentemente das vicissitudes do próprio e intrínseco progresso democrático, as duas nações-continente assentariam um marco, definitivamente não regressivo, no descarte das religiões de Estado, na prospectiva de nosso tempo.

E espanta o quanto os Estados Unidos, no seu apoio aos golpistas no Egito, descartam, em nome da "realpolitik", o seu apoio à dita cláusula pétrea de apoio aos Estados de Direito e aos governos legitimamente eleitos.

Folha de S. Paulo, 2/8/2013