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As surpresas do nosso avanço democrático

 

Os desdobramentos da pressão pelo Código Florestal indicam sinais novos desta maturação do processo democrático brasileiro. Só a democracia aduba a democracia, e a estabilidade política do País, reconhecida internacionalmente, só reforça este avanço da sociedade civil, em todo o seu dinamismo, frente à organização governamental e ao mundo dos aparelhos.
 
Tradicionalmente, o jogo de intercâmbios de interesses entre representantes populares e o interesse do sistema se resolvia na política de clientelas e nos abocanhamentos possíveis de cargos e fatias orçamentárias, de que se faria o peso clássico das situações e dos comandos governamentais. É deste quadro que se aparta, de vez, o novo jogo de condicionamentos que desfigura, por completo, as antigas acomodações e perturba as contas das maiorias previstas.

As fotografias do plenário do Congresso, nestes últimos dias, abarrotados de defensores da dita "facção ruralista" têm todo o perfil do que os cientistas políticos definiriam como pressure groups, na movimentação direta de caras e ruídos, que manifestam o tamanho e, sobretudo, a insistência  em que se explicita esta própria raiz do processo democrático, ou seja,o peso e a visibilidade de um interesse, trazendo à sua dimensão e  à força do seu confronto com o conjunto da sociedade. É fato, dentro das agremiações partidárias, só fluídas como o PMDB, que germinam as facções capazes de criar um partido ruralista, em torno da senadora Kátia Abreu, exprimindo setores nítidos de um interesse produtivo, dentro da política de desenvolvimento sustentado. Está em jogo, em toda a Amazônia e na política do desmatamento, a produção da soja, do etanol e de tantas gramíneas de papel, decisivo, ainda, na nossa exportação, e o papel decisivo, ainda, na nossa estratégia do "salto", e da produção para o próprio mercado interno, que marca o prazo médio e longo da economia brasileira. Mas, ao seu lado, está, e numa primeira coligação inovadora desses pressure groups, a associação com o pequeno produtor, ainda delimitado pela economia agrícola familiar. É ela que, agora, pela mobilização democrática, faz pender a balança dos projetos de lei contra o rigorismo das políticas de reflorestamento, alimentadas pelo ambientalismo, que continua, no Brasil, preso ao nimbo fluido das suas reivindicações. 

O movimento ecológico no Brasil não saiu da crisálida de uma consciência moral, muito aquém, ainda, dos pressure groups, que já se constituíram em vários países do Ocidente. Ou, quando chegam à opinião pública, não a fazem mais como expressão deste mesmo estado de espírito, quase que, ainda, importado na polêmica brasileira. Os rachas que, neste momento, o ruralismo já trouxe a muitos partidos aliados indicam de como os deveres das maiorias, cada vez mais, se amarram ao confronto de dissensos efetivos para se poder rearbitrar em maiorias efetivas. E esse jogo adulto da democracia mal começa no Brasil, prejudicado por um idealismo político mal acordado do seu leito utópico.

Jornal do Commercio (RJ), 20/5/2011