Portuguese English French German Italian Russian Spanish
Início > Artigos > Nossa possível solidão internacional

Nossa possível solidão internacional

 

As presenças internacionais na posse da Presidente permitem já uma primeira leitura do impacto do Brasil num mundo de rupturas das globalizações e das velhas dependências de centro e periferia. Sobretudo, do relevo em que, de fato, somos vistos pelos parceiros de uma nova geopolítica contemporânea. Claro que, no eixo básico desse reconhecimento, a presença de Hillary indica o quanto permanece o governo brasileiro na ótica primeira do governo Obama, inclusive nesse nosso apoio para a recuperação democrática, ameaçada pela torna do pior fundamentalismo republicano.
 
A perspectiva mais larga do mandato de Dilma, na sua projeção internacional, é já a da nação-continente que se desliga do velho ninho da dependência latino-americana, e vai buscar um protagonismo análogo ao da China, ao da Rússia ou da índia, compondo a sigla dos BRICS, desses países de enorme mercado interno e, cada vez mais, a contrarrestar as velhas hegemonias do Primeiro Mundo. Não deparamos nenhuma presença específica de Pequim, Moscou ou Nova Déli na reunião em Brasília, nem nenhum reconhecimento antecipatório da moldura para nossa política exterior, a que se entregou o Ministro Amorim na pasta exercida na inteireza dos dois mandatos.
 
Em nosso berço continental, por outro lado, faltou-nos o destaque da representação argentina e mexicana. Ou seja, das duas nações líderes no avanço do G-20, que tanto deve ao Brasil. Claro, não nos poderia faltar Hugo Chávez, obsessivo personagem de todo  palco continental.

Mas não compareceram Corrêa e Morales, das Repúblicas bolivarianas, num marco, inclusive, em que o governo de La Paz tenha talvez sido o maior beneficiário de uma política de auxílio brasileiro. 

Fique-nos também o outro consolo, de que Paraguai e Uruguai, e este no timbre de seu neopo-pulismo, exprimiram o avanço no nosso novo bilateralismo com os países limítrofes. As Presidências colombiana, peruana e chilena, enfaticamente junto a Dilma, entremostram o quanto são trunfos isolados os que pode contar o Brasil neste avanço do MERCOSUL, cuja bandeira, quase anódina na sua brancura, tremulava ao lado do pendão brasileiro nos mastros do Planalto. 

Redobrou-se, por outro lado, na representação do Oriente Médio, assim como na norte-africana, o pressentimento do que é e como crescerá este protagonismo interferente, e novo no nosso país, na esteira do reconhecimento da Palestina, marcado pela enfática presença de Abbas entre nós, e em toda possível nova releitura das conversações sobre o impasse nuclear do Irã nas Nações Unidas, no caminho aberto pelo governo Lula.

É lamentável, por outro lado, no arranco dos grandes recados, que a França e a Itália se possam perder num contencioso dos incidentes econômicos ou diplomáticos, em sinalização menor da escala em que o Brasil de Dilma não quer se descolar das tradicionais vinculações externas da nossa história.
 
A Presidente, por outro lado, não se eximiu de dizer no discurso de posse o quanto o Brasil-potência, para além dos modelos neoliberais, supõe um Estado provedor direto do seu desenvolvimento. Nem por outra razão, a ecoar os últimos recados de Lula, escapamos ao impacto da crise de 2008, trazendo ao mundo hoje um padrão de mudança, apoiada num regime de esquerda e absoluta democracia. Deparamos, talvez, neste caminho, uma nova solidão, mas a só servir de premissa a um protagonismo inédito, que não se tenha dado conta, ainda, da nova escala de seu desempenho lá fora.

 
 Jornal do Commercio (RJ), 7/1/2011