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Radicalidade arcaica e despertar político

 

O primeiro debate entre os candidatos não suscitou a atenção de mais de 15% dos telespectadores. O começo de campanha não tirou da inércia ainda esta campanha eleitoral, que parece cada vez mais se definir pelos jogos feitos de uma sucessão natural e esperada do governo Lula. O encontro na Band veio ao mesmo tempo em que três institutos de opinião pública confirmam o disparo médio de dez pontos da candidata petista sobre Serra. Mas valeu o susto da radicalidade arcaica, pelo menos como fantasma do que separa as ideologias e uma militância consequente. Veio de Plínio, o octogenário a ser contra o marasmo dos fatos consumados.


Pelo que vimos, há a falar de confronto de candidatos, não de efetivo debate de programas, ou alternativas nítidas numa decisão eleitoral. Os demais contendores só ajudaram no contraponto definitivo entre a petista e o tucano. Marina quer ser a namoradinha do consenso quase pleonástico do nem tanto ao mar, nem tanto à terra. De toda forma, baniu da relevância a questão ambiental, frente aos problemas, de fato, da justiça social, ou das opções do desenvolvimento sustentado, ao nos propor o bê-á-bá das suas prioridades. Plínio nos deu os descartes sumários de tudo que está aí, a que pode ser levada uma esquerda em jejum de toda prática da mudança, e de sua conquista, a pedir, às vezes, as mãos sujas da hora. Não se sai do debate com o contraponto dos macrocandidatos quanto ao modelo econômico envolvido pela mudança.


Serra evitou a armadilha de dias antes, proposta por Fernando Henrique, de que Lula só teria continuado a social-democracia e o que se faz, hoje, de bom no governo, como o Bolsa Família, já foi pensado pelo Banco Mundial e começado pelos tucanos. O paulista sabe que não pode avançar na campanha aceitando o pano de fundo do Consenso de Washington, da amplitude das privatizações, e do desarme do poder público para realizar o desenvolvimento sustentado, na trilha hoje sem retorno, do governo Lula e da sua sucessão nítida pela plataforma de Dilma.


A candidata deixa nítido o papel crucial do Estado nesse processo, e a orientação da poupança para a atividade produtiva, o reforço da Petrobras, ameaçado de virar a Petrobrax no governo tucano, e o absoluto comando público do pré-sal e seus investimentos em educação, ciência e tecnologia.


Não se abriu ainda o debate sobre a amplitude do governo Lula, na nova mobilidade social do país, que não se mede, apenas, pelo acesso à carteira de trabalho assinada, mas pela chegada maciça do Brasil de fora, antes do emprego, à saúde ou à educação. É desses benefícios imediatos que despontou hoje o povo de Lula, independentemente do PT, e dos choques do mensalão, e que não tem dúvidas sobre a opção do 3 de outubro.


É o que dá neste momento a maioria maciça a Dilma, no Nordeste ou no Norte, e agora toma conta do Rio de Janeiro e de Minas, concentrando os votos de Serra em São Paulo e nas circunvizinhanças do Centro-Sul abastado do país. Mas o PAC aí está, ao lado do Bolsa Família, para, nos seus impactos crescentes nestes meses, alinhar Serra no próprio exemplo que deu o seu governo, numa escolha entre duas esquerdas nas eleições vindouras. Só que a intuição do candidato tucano não vai libertá-lo do discurso que dele espera o Brasil bem, frente ao Brasil de fora, sem dúvidas nem surpresas, para as próximas urnas. O primeiro debate acena um epitáfio para uma oposição que possa dizer a que veio, contra o que já sabe o povo de Lula.


Jornal do Brasil, 11/8/2010