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Zapatero e a grande Europa

 

O comparecimento às urnas das eleições espanholas e francesas fortalece a mobilização indiscutível da sociedade civil, pela democracia profunda do nosso tempo. No caso francês, um pleito ainda caracteristicamente municipal mostra que não quer deixar o futuro à simples rotina dos jogos feitos de todo o sempre. Nas cinco mil e seiscentas circunscrições apareceram candidatos independentes, e a necessidade de um segundo turno mostra a mobilização do voto em larga parcela desta ida às urnas.


  De toda forma, o prognóstico das seis maiores cidades do país indica uma vitória socialista que nesses meios urbanos não pode deixar a marca anti-sarkozysta, inimaginável após a vitória fresca de 2006. A direita francesa, de toda forma, vai atribuir o retrocesso aos estritos problemas de alcova, saídos da domesticidade presidencial.


  Já a Espanha consolida a sua democracia nitidamente, no adensamento maciço do bipartidismo indicador, por sua vez, da desaparição do tempo das utopias e do sectarismo político. O recado maior vai à necessária acomodação dos conflitos regionais e da convivência definitiva dos bascos com o respeito consolidado às maiorias de voto. Foram as urnas, nessas áreas da insurgência tradicional, mais eleitores até, que no resto do país, sem alterar o quatro do bipartidismo geral dos resultados.


Tanto Zapatero quanto Rajoy não reconheceram a impossibilidade de guinadas profundas que, no plano econômico e mesmo social, marca os limites hoje da capacidade fiscal do Estado e da distribuição de renda, possibilitada pela prosperidade imperturbada da Espanha. Da mesma forma, a opção socialista evitou a aceleração da agenda da lei do aborto, tal como manteve-se cautelosa em tomar posição sobre as novas políticas imigratórias, como reclama o novo malthusianismo europeu. Rajoy, por outro lado, resistiu à onda anti-islâmica que marca hoje, a partir da extrema direita dinamarquesa, o possível retorno a uma Europa de etnias e guetos históricos. Neste contraponto, levanta-se a demanda turca de entrada na grande Europa, e nas largas estratégias da globalização que tem tido, exatamente, em Zapatero o patrocinador da visão mediterrânea do Velho Continente e da presença islâmica no seu suporte.


   Este bipartidismo consolidado tem também seu efeito na acomodação das pressões possíveis da sociedade civil, mormente num país de habituação mais lenta da Igreja católica ao laicismo, após quase meio século franquista.  Zapatero ganhou, não obstante, a liderança que hoje apresenta a Espanha, a partir do seu governo, no incremento à pesquisa das células-tronco ou no casamento de homossexuais e no amparo de suas descendências.


  No quadro em que uma nova Presidência americana encontrará a União Européia nesses próximos meses, diante da debilidade dos governos de Roma ou de Berlim, ou das próximas eleições inglesas é Zapatero o primeiro interlocutor. E, diante de uma vitória democrata, a voz mais nítida para levar o novo Salão Oval à diferença entre a globalização e a hegemonia.


Jornal do Commercio (RJ) 14/3/2008