Tomou posse, em novembro, na Presidência da União Européia, órgão executivo do bloco europeu, o ex-primeiro ministro de Portugal, José Manuel Durão Barroso, que assume as relevantes funções no instante em que estão sendo escritos os futuros capítulos da nova história e desenhados os mapas da geografia política e econômica do Século XXI, com grandes desafios, mas igualmente com imensas esperanças.
O maior significado da posse de Durão Barroso, contudo, reside no fato de ocorrer após a aprovação do texto da Constituição Européia, cujo objetivo é dispor sobre as relações entre seus estados-membros, devendo entrar em vigor após a ratificação pelos parlamentos nacionais ou consulta popular nas 25 nações participantes do bloco.
Integra, também, a União Européia (UE), além do Parlamento Europeu constituído de até 750 deputados eleitos, o Conselho Europeu, formado por chefes de Estado ou de Governo dos países membros, o Conselho de Ministros, o Tribunal de Justiça da União Européia, o Banco Central Europeu, o Tribunal de Contas e agências especializadas.
Todo esse processo é o resultado de um longo e exitoso percurso, cujo passo inicial se deu em 1951, com a criação da Comunidade Européia do Carvão e do Aço - Ceca, seguido pelo Tratado de Roma (1957), no qual foram estabelecidas a Comunidade Econômica Européia (CEE) e a Comunidade Européia da Energia Atômica (Euratom). Em 1967 houve a fusão dessas entidades e em 1979 foi realizado o primeiro pleito direto para o Parlamento Europeu, em lugar da prática de seus membros serem apontados pelos parlamentos nacionais. Em 1992, registraram-se novos avanços com o Tratado de Maastricht, ao ser instituída a União Européia e introduzido o euro como moeda única do bloco, gerida pelo Banco Central Europeu e implantada em 2002. Finalmente, no ano seguinte, passou a viger o Tratado de Nice dispondo sobre os direitos fundamentais dos estados-membros e seus cidadãos.
Impactos significativos
Convém salientar que tão logo seja ratificada, a Constituição da UE produzirá significativos impactos nos campos cultural, social, econômico e, especialmente, no jurídico-institucional. Com relação a este último aspecto, embora a União Européia se considere mais do que uma confederação e negue a condição de estado federativo, o processo em curso na Europa desabrochará, penso, numa federação como assim o entendia Alexander Hamilton: "associação de estados debaixo de um governo comum, sendo porém a extensão e as modificações desse governo e os objetos submetidos à sua autoridade, coisas puramente arbitrárias" (O Federalista).
Observe-se que, na União Européia, matérias sensíveis como moeda, câmbio, relações exteriores e segurança, estão submetidas a colegiados supranacionais, além da existência de um poder legislativo (o Parlamento Europeu) e de um poder judiciário (o Tribunal de Justiça da União Européia).
Os passos evolutivos da UE, por conseguinte, nesses tempos de globalização, devem servir de reflexão, em virtude do processo de integração regional que se busca via Mercosul, impulsionado no governo do presidente Sarney, e do projeto que reúne todos os países da América Meridional, cuja primeira e bem-sucedida reunião foi efetuada em Brasília, no ano 2000, sob a iniciativa do então presidente Fernando Henrique Cardoso.
Conhecemos as enormes diferenças - políticas, culturais e nacionais - existentes entre a Europa e a América do Sul. Sabemos, em contrapartida, que constituímos povos com histórias semelhantes, patrimônio cultural comum e nos expressamos, exceções feitas à Guiana e ao Suriname, quase no mesmo idioma.
Sem pretender tomar como modelo o que se realiza na União Européia e "sem a pressa que aniquila o verso", como dizia o poeta Edson Régis, convém promover o fortalecimento do Mercosul através, entre outros pontos, da coordenação de políticas macroeconômicas e harmonização das legislações nacionais, livre trânsito de pessoas, bens, capitais e mão-de-obra e, sobretudo, da institucionalização de mecanismos de funcionamento e avançar, concomitantemente, como corolário, na integração dos países da América Meridional.
Jornal do Commercio (Rio de Janeiro) 13/01/2005