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Um outubro de surpresas políticas

 

Deparamos, nestes dias, as surpresas frente ao que se entendia como os jogos feitos no desfecho das crises do Oriente Médio. E, de saída, no embate político do Egito, quando, ineditamente, o líder do golpe militar, o general Sisi, ganha popularidade, enche a Praça Tahrir e vai às massas, num contraponto à derrubada do presidente Mursi.

Até há poucas semanas, o país parecia mergulhar numa inevitável guerra civil, com a denodada resistência dos aliados do governo derrubado. Só cresciam os confrontos de rua, inclusive ao risco de choques frontais e abates crescentes dos defensores do constitucionalismo. Independentemente de toda uma pressão midiática, o chefe do putsch militar procura as ruas e é objeto de uma propaganda de consumo, com a disseminação de chocolates especiais com o seu retrato. Nos novos cenários, nasce a interrogação de se o general passa diretamente a novas eleições, sem a articulação prévia de uma nova Carta Magna. De toda forma, a se vir a um pleito, claramente tal implicaria a definição do destino de Mursi. O fortalecimento do militar poderia, de imediato, levar à aceleração do julgamento do ex-presidente, pelo risco da toma do poder, pela Fraternidade Muçulmana, e da instalação das "guerras de religião". O golpe se justificaria pela manutenção do laicismo político, como contrapeso ao abate da democracia. Por força, também, a realização de novas eleições pode evidenciar a força latente ou adormecida, nestes últimos meses, dos adeptos de Mursi.

Inesperada, por inteiro, também, é a crescente estabilização do regime de Assad, na Síria. O risco da guerra química, avançada por ambas as facções, mas, sobretudo, pelos rebeldes, eliminou o apoio de uma consciência internacional e a possível intervenção das Nações Unidas, após as declarações nítidas de Ban Ki-moon.

Doutra parte, ainda, a infiltração de grupos terroristas nas facções anti-Assad criou um balanço de riscos frente ao primeiro desfecho previsível. O intervencionismo prometido por Obama, no quadro de uma consciência ocidental, perdeu, progressivamente, o apoio europeu, abrindo-se, agora, expectativas de parlamentação com o chefe de governo sírio, inclusive com a expectativa de sua mantença no cargo.

Ainda mais inopinada foi a iniciativa do novo primeiro-ministro do Irã, Rouhani, de procurar a interlocução com os Estados Unidos, num primeiro degelo nas relações entre os dois países - interrompidas há mais de trinta anos - depois da Revolução de Khomeini.

O gesto colheu Washington de surpresa, tanto quanto o líder iraniano confrontou, também, os seus próprios conservadores, em reprimenda do chefe supremo, o aiatolá Khamenei. A aposta é na própria opinião pública do país asiático e no entendimento de uma nova alternativa na política do país, já que o eleito não era, de longe, o favorito no voto.

Mais ainda: num claro desafio a Israel, Rouhani não foi às imaginadas concessões no aproveitamento dos recursos minerais, para a entrada do Irã no clube da bomba. De toda forma, superou-se o quadro de condicionantes à plena inserção do Irã na comunidade internacional, a retirá-lo do quadro de isolamento norte-coreano. E, sem se augurar, ainda, qualquer vaticínio para a plena volta da democracia no Oriente Médio, uma primeira frente de garantia dos direitos humanos - com a proscrição da guerra química e da tortura de combatentes, somada à limitação de penas capitais sumárias - pressagia a torna, na região, de um Estado de Direito.

Jornal do Commercio (RJ), 1/11/2013