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O novo mandato de Lula

 

As conclusões do G-8 indicam a exaustão de uma audiência internacional para as arengas clássicas do que possa ser a dita e redita boa vontade dos ricos por um mundo melhor. Quem hoje consegue, ainda, sensibilizar-se pelo rame-rame do auxílio dos países ricos às periferias desvalidas, ou atentar ao montante desses números, ou ao que foi, de fato, concorder à superação da fome neste começo de século: Ou, mais ainda, quem prestou ouvidos ao mesmo reclamo, por mais piedoso, de Bento XVI na mesma batida quase inaudível?


Ao mesmo tempo, cansou-se o mundo dos apelos ecológicos, ou da nova minudência em que se comprova, ou se desmente, o avanço do efeito estufa, ou do degelo dos confins do Antártico. A denúncia ecológica, com seus tropos e cadências, compensa um universo entorpecido na primeira e essencial correção das desigualdades. Senão, serve de álibi à mantença daquela boa vontade, no que custa tão pouco diante do aporte de fundos contra a miséria do antigo Terceiro Mundo. E como fica, na era de Obama, uma mudança efetiva desta cooperação, ampliando os recursos já disponíveis sob a égide das Nações Unidas, e saindo de uma das burocracias mais coriáceas para fazer do excesso da riqueza uma alavanca, de vez, para superar o hemisfério da pobreza dos nossos dias?


Nada, talvez, de mais significativo para uma realpolitik da era de Obama, do que convocar para a tarefa lideranças estratégicas para a verdadeira mudança. Aí está o convite a que Lula venha a ser o próximo presidente do Banco Mundial e o primeiro fora do Norte e da clássica fusão entre os Estados opulentos e suas corporações para mandar os dinheiros de auxílio internacional. O cenário parece disparate na ação política mundial e surpreende, de saída, o próprio Lula. Mas não nos damos conta de que a era de Obama nasce de estratégias de ruptura e mudança de escala, e já tem, diante de si, um horizonte em que desponta a confiança de nosso Presidente.


Pressentimos este jogo de novos e intransferíveis parceiros imediatos. O apoio de Lula a Ahmadinejad contra a onda intenacional foi mais longe na quebra do isolamento de Teerã, com a marca de uma presença brasileira no Oriente Médio. Vem de par com a nossa emergência junto aos BRICs e o novo quadro mundial que que saímos da canga latinoamericana, junto às nações-chave do novo mundo global. O Brasil de Lula é um claro destaque, por outro lado, com os países bolivianos, de obsessivas perpetuidades presidenciais. E nossa afirmação africana, a partir do antigo mundo lusófono, deixa-nos como parceiros de frente, num continente deixado abandonado durante a era Bush. Que repercussão terá, nesta década, a rapidez com que avançamos nas relações com a China, e o futuro de mercados de modelo territorial, tão distintos das clássicas economias em regressão à nossa volta? Este realinhamento já começou, e o Lula que deponta na era Obama nada tem de comum com as políticas anódinas da nossa minoridade internacional, no melancólico embalo da "boa vizinhança".


Jornal do Commercio, 17/7/2009