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O fim da corrupção consentida

 

O aprofundamento da democracia, tal como a brasileira, nestes tempos de Dilma, nos leva a conviver com as normalizações, ou seja, com a garantia e a certeza de um avanço institucional sem retrocessos, que nos acena para o advento, afinal, de um Estado de Direito e um exercício efetivo da cidadania política. Ou seja, da consciência do vis-à-vis no criticar e no mobilizar, frente a frente, os atores-sociais, até há pouco entrincheirados do sistema de poder, e no anonimato das grandes corporações, guarnecidas pelo comando da opinião pública.

É esse frente a frente, por exemplo, com a presidente, sem usar os mecanismos coercitivos de poder, que leva os grandes bancos a se renderem à redução da taxa de juros, superando um sistema de arbítrio objetivo desses montantes, e, na inércia cristalizada de sua concentração de riqueza. Nossa democracia passa, na sua dimensão econômica mais importante, por esse novo redistributivismo espontâneo, à margem do aparelho legal e da mobilização do Congresso, em novos reclamos à política de clientela, e sua contabilidade devastadora para o desenvolvimento.

Mas o que parece, de vez, estar em causa, é o desmonte, em toda a sua profundidade, das alocações subterrâneas, engastadas em todo o processo de concessões de obras e serviços, que tornava o administrador da hora sócio natural e, via de regra, presumido de todo o carreio de recursos públicos à gestão do desenvolvimento brasileiro. A etapa vigorosa em que, ora, entra o governo Dilma é o abate desta geologia orçamentária, em que tal superposição de dinheiros não surgiria com a evidência de uma "comissão", mas imersa na mecânica builtin.
 
Este plus entrava na naturalidade e no silêncio, em que a ação do Estado supunha um dividendo na expansão da economia brasileira, senão como um bônus da sua crescente produtividade. A avalanche, à catadupa, dos probatórios da corrupção, a denúncia dos procuradores de negócios do Legislativo, e o adido de lucro, do mensalão ao negócio de Carlinhos Cachoeira, ou do grupo Delta, absorviam-se na tolerância coletiva, até agora deixada ao inconsciente coletivo do negócio brasileiro. Se a Era Lula foi a da desmarginalização radical do país de fora, a de Dilma é a da expropriação do excesso de benesses, até hoje consentido, do país de dentro.

Jornal do Commercio (RJ), 18/5/2012