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O copioso ministério e suas superposições

 

O novo Ministério não evidencia, apenas, a amplitude da descentralização de tarefas e funções em que o governo Dilma comandará o desenvolvimento sustentado. São múltiplos os escaninhos das políticas de mudança, e das interações entre o trato da mobilidade social e da situação econômica. Ou do delineio das políticas de igualdade de gênero ou de raça, no tronco de defesa e avanço dos direitos humanos.
 
A cogitação que surge logo, entretanto, é a de se verificar se, em toda essa trama de desempenhos, não enfrentaremos superposições e possíveis embates, nascidos, inclusive - e sobretudo-, da complexidade dos fenômenos sociais à sua frente. De saída, vá-se, no campo do Ministério da Justiça e da Segurança, às políticas de saneamento da violência nas favelas, no entusiasmo em que o Ministro Cardozo se refere às conquistas logradas no Complexo do Alemão, e as vê como extensíveis a todo o país.

O que se interroga, desde agora, é a amplitude e a permanência das forças militares nessas áreas e, possivelmente, o clima de mera trégua, no êxito das operações do Secretário Beltrame, com a cooperação das forças militares. Com efeito, dos 120 bandidos, contabilizados no terror da favela, menos de 20%, de fato, foram presos. Os caminhos dos escapes e, pois, dos retornos, aí estão, na angústia em que os moradores pressentem o futuro sem os fuzis protetores do Exército nas esquinas dos barracos.

A política realista contra a violência vai envolver uma revisão mais profunda, do que seja a garantia da segurança, diante da condição estrutural das marginalidades nas periferias urbanas do país. E em que termos se pode, na cooperação entre os dois Ministérios, de fato, pensar um consórcio permanente do Exército, das Polícias militares, e dos novos serviços comunitários, brotados da liberação da droga e do banditismo? 
 

Doutra parte, ainda, o Ministro das Relações Institucionais, Luiz Sérgio, depara a cooperação oferecida, tão informal como generosa, do Vice-Presidente da República, no trato com o Legislativo. A criação de uma pasta com esta específica competência só surgiu no governo Lula. Até então as Vice-Presidências, saídas do próprio Congresso, davam conta da tarefa, como mostrou esplendidamente o Senador Marco Maciel durante o governo Fernando Henrique, e na mesma dimensão se previra o papel da Vice-Presidência Sarney.
 
A descentralização, por outro lado, enfrenta o problema da multidisciplinaridade, nas muitas atribuições e competências que reclama o desenvolvimento sustentado. E o caso nítido do Ministério de Ciência e Tecnologia, que não pode se afastar da educação, se se pretende generalizar a atividade de pesquisa no país, e esta é indissociável da tarefa universitária. Num quadro como o nosso, de três quartas partes do ensino superior na iniciativa privada, não existe até hoje uma política sistemática de disseminação do input da ciência e tecnologia na mudança brasileira.
 
O hinterland permanece à espera de uma política realística do meio ambiente, que se coadune com o empenho da integração regional no país. Esse imperativo, aliás, continua virgem nas disposições da Constituição, numa dimensão exigida para responder à visão do planejamento brasileiro, como tratado, hoje, pela pasta específica do Executivo.
 
A mensagem da Presidente não mostra, apenas, como superamos a visão neoliberal no novo modelo do nosso desenvolvimento. A nitidez da presença do Estado é sinônimo também da sustentabilidade da mudança. Acautelamo-nos para o futuro, com o Ministério do desenvolvimento estratégico. E já se desenha o Brasil de 2022. Mas como se coordenam, neste momento, as duas pastas? O Ministério de Dilma implanta-se firme neste chão de um futuro já. Mas mal começa, na miríade das pastas, a trama desse avanço de cada dia.

Jornal do Commercio (RJ), 24/1/2011