Os encontros do Rio destes dias evidenciaram uma aceleração intrínseca de uma consciência internacional sobre o futuro do planeta, superando os horizontes das governanças e dos que se viam, apressadamente, como a sociedade civil. Somavam-se, aí, as retóricas da clássica procrastinação dos governos, e das cóleras da hora, do "outro lado" dos Estados, como as ditas ONGs. Não são esses os exclusivos protagonistas do que seja esse inconformismo social difuso e não atendido, que leva às revoluções ou ao encastelamento dos reacionarismos sem volta. O reclame difuso dessas horas foi, exatamente, o da falta de prospectiva, a permitir qualquer expectativa de progressão da Rio+20 a uma Rio+40, contradizendo o marco de 92. Foi quase diáfano o arremedo de protesto, avançado pelos ditos movimentos comunitários da União Europeia, na falta de proposições afirmativas do documento. E nem se espere o consolo dos simulacros de protesto nas ruas do Rio, feito por uma legião estrangeira, de diversos inconformismos, deixados ao minigrito e à sua miniamostragem.
A ecologia marcou-se, cada vez mais, e até agora, como movimento defensivo, a sair da sua inércia, aqui e ali. Reflete um momento da consciência do processo histórico, mas atropela outras prioridades, nesse "aqui e agora" do começo do século, como a do pacifismo e sua grande utopia, ainda há uma década, ou das afirmações identitárias das culturas ameaçadas pelo Ocidente, pelo desponte de um terrorismo internacional . Ou pela torna ao fundamentalismo, inclusive no Ocidente, como representam os clamores políticos dos republicanos dos EUA. Não afloraram estes problemas da Rio+20, tal como se tomou notória a falta relativa da voz islâmica, em contraste com a maciça presença africana, a que não faltou o portentoso auxílio logístico brasileiro. A Eco-92 podia, em boa consciência, ser um grito de alerta ao advento de uma globalização que se quisesse planetária e, de vez, não-hegemônica. A Conferência de Johanesburgo, há uma década, pôde se permitir, ainda, as expectativas politicamente corretas, cometidas ao deslanche no Rio. Mas o protagonismo inconsciente e já ensaiado seria o dos BRICS, em contraposição, de vez, às velhas periferias do Terceiro Mundo. Não foi esse, ainda, o momentum do Rio em que a voz de Dilma teve, ainda, pálidas respostas da índia e da China, e a nova sustentabilidade do Sahel africano começa sob a liderança da França de François Hollande.
A esperança, talvez, de um real avanço passa pelo desgaste definitivo das palavras-álibi, tal como, de vez, acontece com o conceito de diálogo. À margem de uma real prospectiva, o marco crítico que emerge da Rio+20 é o de sair-se da tônica do óbvio de reclamar-se em abstrato pelas diferenças. Impõe-se uma "humildade zero" no buscar os "vis-à-vis" e os verdadeiros limiares do confronto. Passou-se o período de toda a ingenuidade nos ditos "desarmes dos espíritos", para encontrarmos os "olhos de ver" das verdadeiras relevâncias no mundo dos fundamentalismos da direita europeia, da perda do laicismo, nas constituições da defunta Primavera Árabe.
Jornal do Commercio (RJ), 29/6/2012