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A era Obama paga seu preço

 

A inequívoca aceleração história do mundo pós-Obama aí está na tomada de oposição da extrema direita conservadora, nos Estados Unidos, e nas antigas periferias, na dissesão da "esquerda da esquerda", nas coletividades indígenas da América Andina. Demorou ainda o republicanismo bushista, a encontrar o foco do confronto com a nova Presidência, avivada agora pela consagração que lhe dá -too much, too soon - o Prêmio Nobel da Paz. Este reconhecimento maciço vem de par com o avanço da idéia gêmea à da democracia, que é a do pluralismo na multiplicidade de expectativas de mudança que se abrem a um país que se liberta de sua insegurança internacional pela guerra preventiva, e pela "civilização do medo".


Acusariam alguns, Obama, na radicalidade do novo situacionismo, de demorar na saída do Iraque ou do Afeganistão. A crítica não faz jus à determinação do Presidente de querer, de vez, mudar um clima mundial, de possível coexistência não hegemônica com a nova Casa Branca.


O sucesso de Obama no pronunciamento junto às Nações Unidas, há um mês, é o do avanço desta credibilidade, a começar por um modus vivendi com o antigo "eixo do mal" onde, talvez, a sinalização da Coréia do Norte se antecipe à do Irã de Ahmadinejad. A não se transigir mais nos eufemismos, é a filha do ex-Vice-Presidente Cheney que dá início ao movimento -"a decadência é uma opção" -e há que cerrar fileiras em torno da nova prioridade da hegemonia sem disfarces, nem meio termo.

 

o movimento vai ao extremo do pior perfil bushista, freando as tratativas de ampliação de alianças no Congresso para levar à frente o plano de saúde exemplar de Obama ou a reforma de taxação das grandes fortunas do país.

 

No pólo oposto do cenário político de hoje, mas exprimindo um mesmo fundamentalismo básico, as confederações indígenas do Equador rompem o primeiro elo da aliança política que levou Correia às reformas estruturais do velho e crasso status quo semicolonial do governo de Quito. O que está em causa, em curioso paralelo com o avanço social da esquerda brasileira, é

a utilização maciça da nova riqueza petrolífera equatoriana, em analogia com o nosso Pré-sal, para uma imediata política de melhoria coletiva. Não se quer mais esperar pelo bizantinismo das decisões dos colegiados tribais, a que hoje a Carta Magna do país empresta a última decisão num programa de desenvolvimento. Vem à tona a clássica verticalidade do governo na acusação de abandono do regime exaustivo de consultas, na expectativa da coletividade Quétchua trazida para a vitória de Corrêa.


O que está em causa é o quanto a política social pode se afastar do dito princípio sumak kawsay, tal como a comunidade indígena ancestral entende o que seja o seu bem comum e associa ao trabalho a garantia do lazer, e um respeito mágico pelos contornos ambientais. No que as lideranças da Coordenação Andina de Organizações Indígenas vêem como uma quebra à esquerda, evidencia-se se o problema crítico de como uma política de desenvolvimento sustentado deve enquadrar o meio ambiente frente à incipiente agroindústria e à produção extrativa de base do país andino.


O mundo que chega ao fim da década, com o impulso deste ano eixo de 2009, mostra, de toda forma, o quanto não são as políticas de segurança a todo preço, nem as da realpolitik de uma civilização do medo, nem as de um fundamentalismo identitário redivivo que travarão o avanço da democracia que voltou ao Império, no subversivo pluralismo da convivência da era Obama.


Jornal do Commercio (RJ), 6/11/2009