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E o governo não recuou

 

As respostas de Dilma aos comitês grevistas indicam, de vez, a tomada de posição governamental sobre os rumos, a largo prazo, da redistribuição da renda brasileira. A prioridade é clara: vai à garantia da estabilidade do trabalho, e, sobretudo, da entrada definitiva no regime salarial dos nossos segmentos coletivos ainda marginalizados. Confronta-se, agora, o Planalto, às pressões, nascidas do funcionalismo público excessivo, já que não nos livramos, ainda, da herança da clientela colonial. Não são outros os atores, ora em cena, que superestimam a sua capacidade de alastrar o processo grevista, confiantes no profissionalismo manipulatório de todo o sempre.

Pela primeira vez, o governo não recua, disposto a dar um basta às atuais vistas grossas das autoridades, à falta de assinatura de ponto e à ausência dos serviços.

O que está em causa é o assento da remuneração do trabalho na definitiva generalização do salariado brasileiro, e seu direito à contínua expectativa de melhora. Neste pano de fundo, está o sucesso dos últimos governos, não só da drástica redução da marginalidade social pelo Bolsa Família, mas, também, da sua saída de um primeiro assistencialismo econômico. O significativo, agora, é o quanto os setores entrincheirados na greve não lograram a prevista extensão nacional do protesto, nem se avantajaram nos seus próprios núcleos de confronto, como o da Polícia Federal. Marcante, agora, é, sobretudo, o cuidado com que os efetivos sindicatos de trabalhadores, a CUT à sua testa, exprimem a sua solidariedade com os grevistas, nos votos do feliz desfecho às tratativas com o governo, mas em nada cogitam de uma generalização do movimento.

O amadurecimento democrático do país cobra, hoje, uma efetiva autoavaliação, pelas coletividades interessadas, na passagem às greves, e a atualização de suas lideranças, via de regra, presas, cronicamente, à contínua renovação de seus mandatos. Da mesma forma, superaram-se, nos últimos incidentes à porta do Planalto, as provocações diretas à presidente. E, sobretudo, o desarme de todo clima de represália da autoridade, esperada como gatilho da explosão do dissenso pelo velho regime grevista. O choque com o obsoleto sempre aproveita à democracia.

A solidariedade social e a erradicação da pobreza saem dos clamores clientelistas, apontando aos caminhos da redistribuição de renda, sem as transigências do velho

Brasil do status quo e do “tudo bem”.

O Globo, 1/9/2012