Portuguese English French German Italian Russian Spanish
Início > Artigos > A Copa do êxodo europeu

A Copa do êxodo europeu

 

Qual a consciência cívica brotada, de fato, dos jogos da Copa? A irradiação do canto dos hinos a cappella surge quase como uma explosão da hora, diante das expectativas em campo. Mesmo porque a nacionalidade das equipes se perde diante da familiaridade internacional dos jogadores, na sua maciça maioria pertencendo aos superclubes mundiais. E é mínimo o de protagonistas vindos da própria pátria. Somente a Rússia tem time jogando todo na terra.

O que avulta é a força das torcidas, no deslocamento maciço para o Brasil dos milhares de chilenos, colombianos e argentinos, na proeza logística dos holandeses, desembarcando de ônibus, após o cruzamento oceânico. Essas levas migraram em todo o país, independentemente das facilidades hoteleiras, na fieira de cobertores, em meio à calçada dos estádios. Não ficaram indiferentes os nossos espectadores no aplauso aos outros times, e, inclusive, a mudar de lado no curso do jogo. O sentido básico da nossa identidade cultural levou-nos, significativamente, não só a torcer pelos africanos contra os europeus, mas a preferi-los aos próprios colegas continentais.

De edição em edição dos campeonatos mundiais, haveria de falar, ainda, em aportes ou novos hábitos trazidos à competição pelo avanço da violência nas ditas trocas de passe ou posse da bola. Foi-se do engalfinhamento ao agarro das camisas e às rasteiras ao adversário. A exceção foi a equipe americana, no proclamar a condenação às agressões físicas como código de suas performances.

O campeonato tem sido, por outro lado, fértil na construção da jogada coletiva, na elaborada sinfonia da chegada às traves. Sem, no entanto, se sobrepor à inevitável tentação da escapada e da individualização na feitura do gol. É essa dominância do individual sobre o coletivo que responde pelos constantes clímaces das partidas, e não há precedente, nas últimas Copas, da avalanche de gols, levando à fruição continuada do espetáculo. Nem, talvez, por outra razão os contendores apostem tudo nos primeiros e nos últimos instantes da partida, desarrumando as muralhas defensivas, num assalto ao "tudo ou nada", com até os goleiros vindo ao meio de campo.

O jogo vem de par, cada vez mais, com o espetáculo do forçamento dos pênaltis, nas múltiplas contorções nas quedas. A construção do pênalti primaria sobre a fatura do gol, mas o que se vê, cada vez mais, em campo, felizmente, é a decisão estando no arremesso trabalhado dos artilheiros.

Jornal do Commercio(RJ), 27/6/2014