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Administrar ainda a esperança

 

O aumento, afinal, do nosso PIB nesses dois trimestres suados, tem o impacto do apontar, afinal, para a saída do nosso imobilismo nesta última década. E o espetáculo adiado de Lula, é exatamente este do número difícil e sofrido, mas que pode finalmente retirar-nos do túnel da inércia, e dar-nos o arrimo entre contra-vapores continuados de expansão. O passo à frente patina no pantanal da globalização e do vai e vem, afinal, de uma economia onde não existe ainda projeto, mas só conjuntura. O impacto de 53% da dívida externa sobre o PNB nos obriga a este ganho do dia-a-dia, miragem amanhã, não fosse a estiva de cada hora do tandem Palocci-Meirelles.


Na demora da partida, precipitou-se o risco de se tornarem as próximas eleições municipais um plebiscito antecipado à reeleição, forçando o governo diante do cata-votos nas prefeituras, para manter-se à frente da opção de futuro prometida nas urnas. Sobre os riscos ou fatalidades do mercado econômico, adicionou o Planalto o de realizar um mandato de transformação social. E para ficar.


Acolheu também o PT os ônus da construção de maioria paquidérmica, ao fazer de todos os seus aliados da vitória no segundo turno, sócios do poder. Somou ao puro sangue da legenda para a mudança toda uma coorte de facções arquivinculadas ao status quo, e ao bom leilão de cargos, prebendas, benesses, do antigo tonel sem fundo do situacionismo político. Ganhou, por aí mesmo, a chance de desemperrar as primeiras reformas essenciais à mudança, qual a previdenciária e a fiscal. Mas o fez na média-média do que permitiria este possível da prática brasileira, com a balança apontando à esquerda. Mesmo limitadas, as leis revestiam o enorme capital simbólico de vencer a mitologia da inércia e das questões intocáveis a qualquer fervor mudancista até hoje esbarrava - como fez o tucanato - no enredamento pelo status quo.


O saldo do avanço, não obstante, pode se pagar pelo perigo de que as legendas aliadas se transformem agora em cobradoras de Lula no chão municipal do País, em que pisa pouco, ainda, o partido da virada e do compromisso da transformação social. E, talvez aí, também a registrar, de uma troca de leitura de recados. O que significará uma derrota de Marta em São Paulo e quantos pontos perdidos implica contra um mapa confortável de prefeituras interioranas que ganhe o PT?


O Planalto vence, neste trimestre, uma luta contra o relógio, para não começar em desvantagem no deslanche, de vez, da briga pelo “Lula lá” em 2006. Seus trunfos, logo, estão, de saída, no desembaraço da máquina do Ministério do Desenvolvimento Social, ganhando o esperado exponencial de resultados, integrando o trabalho prévio do “Fome-zero” e da pasta de Benedita. Criou-se a hiperestrutura para dar-se de comer ao Brasil que tem fome, e não da esperteza dos atravessadores, nos dutos crônicos da clientela.


Mas o que conta agora é o outro pé do ir à promessa de partida - a da luta contra o desemprego. Vai maciçamente ao Ministério das Cidades, e ao que possa a iniciativa e a inventiva, num País de 78% da malha urbana e, sobretudo, no seu desamparo, das periferias das megalópoles brasileiras. Não se peça ao parque industrial ora constituído nem, sobretudo, ao novo esplendor do agro business, o absorver-se emprego já que, para tal não se constituiu esta estrutura de produção. Nem se a pode alterar, no ritmo e no chicote da competição internacional de por onde, inclusive, começa o assentamento firme do país que decola. É na pasta de Olívio Dutra que se responde à voracidade da mão-de-obra desocupada do País, nos canteiros gigantes do saneamento; das estradas vicinais; do arruamento e, sobretudo, dos programas habitacionais. A cultura do PT acostumou o seu primeiro eleitorado ao espetáculo do mutirão e do tijolo sobre tijolo que extrai das horas de sono - ou dos feriados do trabalhador.


Afinal, a construção civil se transformou, de sempre, na embocadura do êxodo brasileiro do último meio século. Mas terá o Planalto passado da posição passiva, de só responder a demandas locais do Município e do Estado para enfrentar o desemprego brasileiro? Está em marcha, contra emperros burocráticos desses trabalhos, uma vigorosa iniciativa federal de obras públicas, que façam a diferença, no mínimo do que se precisa, para o muito a que o povo continua a abrir crédito ao presidente-operário. Pequim e Xangai viram as imagens de Lula que levantaram as platéias da nação da paciência petrificada. O apoio pessoal ao presidente é em 30% superior ao do Ministério. O efeito de sideração que continua atravessado as municipais, multiplica-se, aos primeiros sinais de mudança.


Não há precedentes, quanto à cota simbólica, que põe Lula numa sinergia de sucesso de liderança, reconhecido à frente do velho terceiro mundo. Patrus e Olívio Dutra são os corredores decisivos da maratona do PT, no revezamento e no bastão que lhes passam Palocci e Meirelles. E tem um trimestre para assegurar a proeza de fundo para o “Lula lá” em 2006.


Jornal do Commmercio (RJ) 18/6/2004